Resumo
A partir da focalização de um episódio nuclear do romance Paisagem com mulher e mar ao fundo (1982), de Teolinda Gersão, este artigo propõe suscitar reflexões sobre os sentidos desdobrados da figura opressora de Oliveira Salazar e os efeitos de sua ação ditatorial sobre o país. Não apenas o conteúdo político contido nesse momento histórico, mas, principalmente, o modo como esse recorte é tratado ficcionalmente e gera efeitos para além da pontualidade do acontecimento. Nesse caso, o “acontecimento” (noção colocada por Jacques Derrida) tem que ver com a linguagem, enquanto “desconstrução” e “diferença”, enfim, uma escrita enquanto “devir” que rasura o factual para re-configurá-lo em outro espaço – o da escritura. É por meio desta que a romancista portuguesa utiliza alegorias que problematizam, tanto a figura do Poder quanto a da massa revolucionária que busca derrubá-lo. Visionarismo, mitogenia, sacralização, ritos religiosos, profanação, polifonia acabam despontando na narrativa como recursos estéticos que propiciam interessantes indagações sobre a Revolução de Abril. Eis a atualidade desse romance de Teolinda Gersão. Nosso corpus crítico está constituído por Rolando Barthes, Octavio Paz, Walter Benjamin, José Miguel Wisnik, Flávio Kothe, entre outros autores.
Referências
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